Open Science (Ciência Aberta)

Vou te contar (escrita criativa)

Marina, senta aqui, vou te contar uma história.
Eu sempre disse que você não tinha pai. Na certidão de nascimento está só meu nome, eu sei.
Eu te criei sozinha, e você sentiu o peso da responsabilidade de sermos só nós duas no mundo, e o mundo pesa, pesa toneladas.
Em uma corda-bamba entre penhascos, sob um monociclo, vivemos uma vida toda equilibrando o peso do mundo.
Sabe aquela história de que precisa de uma comunidade para criar um ser humano? Pura mentira.
O mundo odeia mulheres. Mulheres pretas e grávidas, então. Odeia mais ainda.
Não servem para o trabalho, não servem para cuidar de ninguém, e ainda vão ter uma criança preta para criar... uma criança que mama, e que chora, aí só vem desprezo de tudo quanto é lado.
Eu morava em casa de família, morei desde sempre, uma família que me buscou em Barreiras e me levou para São Paulo quando eu ainda era criança.
Não estudei, apenas limpava a casa, cuidava das crianças, e adormecia num quartinho sem janela que ficava logo depois da cozinha, junto com a despensa.
Só que um dia a patroa mandou eu ir ao mercadinho do bairro, à noite, comprar sonho.
Engraçado isso de comprar sonho, né Marina? Comprei o sonho dela, e fiquei pensando se sobraria algum pedaço para mim, se algum pedaço de sonho nesse mundo cabia naquele quartinho-sem-janela.
Só que naquela noite conheci seu pai, e senti uma quentura que vinha debaixo da saia. Ele me olhou e eu me derreti inteira.
Era o vendedor do sonho, e me vendeu várias histórias, e passamos a nos encontrar quando todos da casa estavam dormindo, e o mercadinho já havia fechado.
E eu, que não sabia nada do mundo, vi minha barriga crescer, até que a patroa me colocou para rua quando você estava prestes a nascer.
E o vendedor do sonho foi embora, o dono do mercadinho disse que ele saiu e nem pediu as contas.
Ficamos eu e você, Marina. E a vida não foi gentil conosco, nesse mundo que odeia as mães e nos coloca na corda-bamba-em-um-monociclo.
Por sinal, o nome do seu pai era Josemar, por isso seu nome é Marina, e ele me prometeu levar para conhecer o mar, e cá estamos nós, na praia, como se fosse um sonho.
Ana Luisa Zago

The non-criminalization principle in Brazilian Migration Law

In the study of migration, one aspect that deserves special attention is the tendency of immigrant’s criminalization by host countries and the mechanisms of international and domestic law to suppress such phenomenon. Hence, the purpose of this article is precisely to address these mechanisms and develop the theoretical construction of the “non- criminalization principle”. https://www.e-publicacoes.uerj.br/pbl/article/view/34650/24483

Futuro digital (escrita criativa)

A vida exige da gente estar sempre “on-line”: respostas imediatas a qualquer momento do dia.
“Seu trabalho é a disponibilidade”, já disse um chefe em um alto cargo high-tech que tive.
O novo proletariado não tem domingo, não tem feriado, não tem férias.
Não dorme, não almoça, não vai para casa ao meio-dia fazer almoço e assistir ao noticiário em família.
Trabalha em casa, trabalha no trabalho.
Trabalha.
Não produz, mas trabalha.
Assim você pode conviver mais com os filhos, dizem.
E os filhos ficam ali na frente do YouTube, que vai decidindo, entre vídeos curtos em um encadeamento infinito, com será o cérebro daquelas crianças.
Crianças dispersas, pais dispersos.
Ninguém está ali.
Zumbis digitais, sem presença, sem presente.
Cansaço, distração, desinteresse, excesso de informação, falta de vida.
Em algum lugar há o sol, a areia, a grama, e ouvem-se corações pulsantes.
Não ali, onde tudo se mistura e o tempo flui acelerado e desatento, entre os dedos os grãos de areia do tempo passam, caem ao chão, e são varridos para longe da assepsia do lar-trabalho-tela-sem-dia-sem-noite-sem-estações-do-ano.
E rumo a um futuro incerto.
Digital.

10 de dezembro de 2024

Ana Luisa Zago de Moraes

Colonialismo digital (escrita criativa)

Li esses dias que o Brasil não produz chips, tampouco semicondutores, e que as plataformas utilizadas pelas Universidades para armazenar suas pesquisas são estrangeiras.
Colonialismo digital, chamam.
Soube também que os projetos para produção de semicondutores e chips no Brasil ficaram todos inacabados.
Terminou o orçamento e não entregaram, disseram.
Foi o ano fiscal: no outro ano, não houve orçamento para o projeto.
O coordenador teve que mudar para Singapura com a família, alguns pesquisadores conseguiram bolsas nos Estados Unidos e na Europa, e o auxiliar administrativo “virou” Uber.
Uma jornalista tentou pautar o tema na grande mídia, mas os trending topings do Twitter eram sobre política, religião, gênero e racismo.
Se não tiver ódio não vende, disse seu Editor-chefe.
“Mas não é o colonialismo digital que está pautando essa polarização toda? Se não tivermos tecnologia para contrapor vamos virar fantoches!”.
Nisso ela viu as cordinhas movendo os braços do editor, e pensou que é mais fácil vender ódio mesmo.
10 de novembro de 2024 Ana Luisa Zago de Moraes

Tráfico de pessoas, migração e tecnologia: o papel das instituições brasileiras e portuguesas

Palestra proferida em 21 de fevereiro de 2025 no III Congresso sobre Tráfico de Pessoas da Faculdade de Direito Mackenzie, em São Paulo-SP, no painel "tráfico de pessoas migração e tecnologia: o papel das instituições brasileiras e portuguesas na mitigação do crime de tráfico de pessoas", juntamente com os Profs. Fábio Bechara (MACKENZIE) e Gustavo Acciolly (MPT): https://youtu.be/-EWCjsjDoro

Justiça de transição e a memória das ditaduras

Live do Instituto Aspektas José Carlos Moreira da Silva Filho e Ana Luisa debatem sobre a temática da justiça de transição e qual a sua importância para a memória de um país, especialmente em momentos de fragilização da democracia e de escalada do autoritarismo. * José Carlos Moreira da Silva Filho possui graduação em Direito pela Universidade de Brasília (1993), mestrado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (1996) e doutorado em Direito pela Universidade Federal do Paraná (2002). Foi professor do Programa de Pós-Graduação em Direito da UNISINOS (mestrado e doutorado), Avaliador do Ensino Superior MEC/INEP/OAB e Conselheiro e Vice-Presidente da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. Atualmente é professor no Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais da PUCRS (mestrado e doutorado) e na Faculdade de Direito da PUCRS. É também Bolsista Produtividade do CNPq. Concentra suas pesquisas e suas demais atividades acadêmicas na temática da Justiça de Transição e dos Crimes do Estado. https://youtu.be/QJAuqOw2CaY

Model International Mobility Convention

Professor Michael W. Doyle, from the Columbia University, is invited as Speaker for a Conference at the Brazilian Branch of the International Law Association. As discussants, the Conference counts with Professor Aziz Tuffi Saliba, Lutiana Valadares Fernandes Barbora, Ana Luisa Zago de Moraes and Flávia de Ávila. https://youtu.be/sLXL8Uxjp3E    

Sobre mim

Ana Luisa Zago de Moraes atualmente pesquisa proteção de defensores de direitos humanos ameaçados e regulação das plataformas digitais e dedica-se à escrita criativa e à pintura. Está vinculada à Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), na área do Direito Digital (Estágio Pós-Doutoral) e à OLS-NASA, no Programa “Nebula-Cohort” de promoção da Ciência Aberta através de mentoria de pesquisas. Doutora em Mestre em Ciências Criminais pela PUCRS com a tese "Crimigração: a relação entre política migratória e criminal no Brasil" aprovada com voto de louvor e Menção Honrosa do Prêmio Capes de Teses 2016 (área do Direito). Mestre pela mesma instituição e graduada em Ciências Jurídicas e Sociais pela UFSM. Autora de livro publicado pelo IBCCRIM, com mesmo título da tese, como resultado do seu 20 Concurso de Monografias. Também é autora da obra “Guia prático de defesa penal de pessoas em situação de vulnerabilidade perante a Justiça Federal” (Dialética, 2022). Tem experiência nas áreas de Direito, com ênfase em Direito Internacional dos Direitos Humanos, Direito Migratório, Justiça de Transição, Direito Penal Internacional e Internacional Penal. Desenvolve pesquisa sobre direitos humanos e política criminal, com ênfase na criminalização de indígenas, migrantes, nos mecanismos de controle por inteligência artificial. Foi Professora do Mestrado em Direitos Humanos da Uniritter, Defensora Regional dos Direitos Humanos do Rio Grande do Sul (DRDH), fundadora do Grupo de Assistência Transdisciplinar aos Presos Estrangeiros do Estado de São Paulo, Conselheira do Conselho Superior da DPU, coordenadora do Grupo de Pesquisa "Ética, Direitos Humanos e Inteligência Artificial" no âmbito da Escola Nacional da Defensoria Pública da União, Defensora Pública Interamericana e Diretora de Defesa de Direitos Humanos do Ministério dos Direitos e da Cidadania. Organizou e coorganizou publicações como  “A tutela coletiva de vulnerabilidades pela defensoria pública da união durante a pandemia da COVID-19” (Tirant Lo Blanc, 2024), “Reflexos: as mulheres e suas imagens no sistema de justiça” (ANPR, 2023), “Inteligência artificial e direitos humanos: aportes para um marco regulatório no Brasil” (Dialética, 2022). Para saber mais: currículo no  http://lattes.cnpq.br/9101961260324224  
Sobre Mim

Ana Luisa Zago de Moraes atualmente pesquisa proteção de defensores de direitos humanos ameaçados e regulação das plataformas digitais.